O diretor e roteirista Kenneth Lonergan havia convidado Matt Damon para o papel principal de Manchester à Beira-Mar, mas o ator recusou o papel (seria por agenda? preferiu fazer o filme pipoca A Muralha (The Great Wall)?), e o que vemos é que ele acabou por entregar de bandeja à Casey Affleck a oportunidade da vida de ganhar o Oscar de melhor ator. Presente de amigo? Vai saber, os dois são amigos de infância, Casey é o irmão mais novo de Ben Affleck.
Manchester é uma cidade que invoca a presença de Lee Chandler (Casey Affleck) quando seu irmão mais velho falece e ele precisa organizar o processo do funeral e assumir a guarda de seu sobrinho Patrick (Lucas Hedges).
De Boston para Manchester leva-se uma hora e meia de estrada, mas percebemos que Lee não vai à cidade há muito tempo, fato que vai se clareando aos poucos, entre o presente monótono e taciturno do homem que trabalha como uma espécie de encanador para uma pequena empresa que administra quatro prédios.
Há uma camada de angústia nos olhos do personagem, é palpável a ideia de um luto eterno, uma autopunição por algo que ocorreu no passado e que não é permitido o perdão por motivação própria.
Lee Chandler parece cumprir os dias na terra como se por inércia, e o luto arruína alguns momentos de sua vida, pois ele não se rende a flertes iniciados por uma garota bonita num bar, mas parte para a violência na mesma noite quando dois homens do outro lado do balcão o olham de um modo que o incomoda.
São vários os flashbacks que se entremeiam com o presente, entre a burocracia com a morte do irmão e os momentos que explicam a causa que transformou a vida de Lee Chandler de uma maneira trágica e que por Manchester ser uma cidade pequena, lhe rendeu fama entre os moradores, volta e meia se ouve alguém perguntando “é o famoso Lee?”.
Mas apesar de toda essa carga negativa, eis a proeza de Kenneth Lonergan, que garante um drama e não um melodrama, com cenas mais contemplativas e degustáveis do que um ritmo de choradeira gratuita, e salpicado de momentos engraçados, como as que envolvem seu sobrinho, entre duas namoradas, uma banda e seu temperamento adolescente que lida com a morte do pai de forma não muito dramática e vê a vinda do tio como um problema visto que ele não pretende ficar em Manchester por não suportar a carga do passado.
Se Manchester é um filme que emociona muito, não é o trauma do passado o ingrediente especial, e sim como lidamos com perdas e como superamos ou não isso. O fardo é pesado e o auto perdão é precário até em ensinamentos religiosos se comparados com outras parábolas, e é uma das coisas mais difíceis de conquistar na vida, até mais do que um Oscar por melhor atuação.
Ma’a salama